Iraque

Olhei Brad de lado quando o vi afastar-se e pensava que ele ia embora, quando saltou para o lugar do condutor. Encostei a cabeça ao vidro do jipe e tirei do meu saco um pouco de água para beber. Tinha que ir à cantina buscar mais sacos de açúcar, nunca andava prevenido na hora certa.
-Não devias fazer isso, agora a Karen vai dar-te cabo da cabeça - murmurei praticamente sem voz.

Eu sabia que depois disto o mais provável era sofrer algumas consequências, Karen ia passar-se, mas eu estava demasiado preocupada com Daniel para pensar nisso. Só queria chegar rápido ao acampamento. Olhei para trás por cima do ombro quando me pareceu que o tinha ouvido falar e tive de fazer um grande esforço para perceber o que dizia.
- Não me interessa.- disse.- agora, aguenta-te, por favor, já estamos quase lá.- disse, voltando a olhar em frente e vi o acampamento ao longe.

Passei as minhas mãos umas pelas outras e olhei em volta fechando depois os olhos por causa do sol. Eu sabia que mal comece alguma coisa que tivesse açúcar ia ficar bem, isso e se dormisse alguma coisa. Eu conseguia aguentar, sim. Assenti para mim mesmo e quando voltei a olhar pela janela ja vi as reconhecidas tendas - podes ajudar-me a ir até à tenda? - perguntei ainda sem voz.

Travei o carro mal chegámos ao acampamento e fi-lo com tamanha brusquidão que os pneus chiaram. A sorte era que aquilo estava quase deserto, por isso, poucas foram as atenções que se centraram em mim. Saltei do jipe, indo logo ter com Daniel e abri-lhe a porta, ouvindo-o falar.
- Ajudo.- respondi, esticando os braços para conseguir agarrar nele e tirá-lo d tenda, encostando-o a mim depois.- há alguma coisa que possas tomar para isto passar? - perguntei enquanto o guiava em direcção das tendas.

Não sei como é que não me magoei quando ele travou, apenas bati com a cabeça no banco da frente, mas consegui continuar acordado. Quando os meus pés tocaram no chão as minhas pernas perderam as forças, mas lá as consegui voltar a levantar. Assenti com a cabeça que estava colada ao seu corpo - é uma quebra de tensão, preciso de açúcar - murmurei indo até à tenda com a sua ajuda, agradecendo pela outra não estar lá

Açúcar, precisava de ir à cantina o mais rápido possível, não havia tempo a perder. Assenti, sem dizer nada, e assim que chegámos junto da nossa tenda abri-a, baixando-me para conseguir entrar ao seu lado. Levei-o até à sua cama e ajudei-o a deitar-se, olhando-o depois.
- Fica aqui, está bem? - baixei-me até lhe beijar a testa, visto que ali já ninguém nos via.- eu vou buscar-te açúcar, aguenta só mais um bocadinho.- pedi, endireitando-me e antes de ter tempo para ouvir a sua resposta, já eu me estava a encaminhar para a cantina.

Senti o meu corpo relaxar ligeiramente depois de me deitar, mas nem por isso conseguia deixar de sentir as minhas pernas e as minhas mãos a tremerem. Puxei as mantas para cima de mim, não tinha frio mas os suores frios eram bastante desagradáveis. Fechei os olhos quando senti o beijinho de Brad e apenas assenti com a cabeça vendo-o correr para fora da tenda.

Entrei de rompante na cantina, pouco me importando com as mulherzinhas, que se pareciam ter assustado com isso. Agarrei no máximo de pacotes de açúcar que consegui e ainda antes de sair, peguei também em duas garrafas de água e em duas sandes. Voltei a sair, da mesma forma como entrara e corri para a tenda, vendo Daniel ainda deitado quando lá cheguei.
- Toma.- disse, ajoelhando-me junto à cama e esticando os pacotes de açúcar.- trouxe muitos, por isso engole os que forem preciso.- murmurei ainda preocupado e olhei-o.- vais ficar bom não vais? - perguntei, juntando as sobrancelhas.

Levantei a cabeça com algum esforço quando vi Brad entrar de novo na tenda e agarrei num pacote de açúcar rindo com o tom de voz rouco quando me disse para engolir os que fossem precisos. Levei um pacote de açúcar à volta e deixe de novo cair a cabeça fechando os olhos - nunca tiveste uma quebra de tensão? - não era bem igual, mas era uma coisa parecida. - eu já fico bem.

- Já.- respondi com um encolher de ombros.- mas eu estou preocupado contigo, não estás com muito boa cara.- suspirei e esperei até que voltasse a deitar a cabeça na almofada para começar a passar os meus dedos pelo seu cabelo de forma cuidadosa.- precisas de mais alguma coisa? - perguntei.- tens fome? Eu trouxe uma sandes.- disse, sem parar de mexer no seu cabelo e sem parar de o olhar.

Voltei a rir abanando a cabeça e puxei-o pela camisola - obrigado, eu sei que sou lindo - brinquei - não tenho fome, nao consigo comer, só preciso que fiques aqui - disse de olhos fechados - ficas? - perguntei baixinho passando os dedos pela camisola ensaguentada dele.

Revirei os olhos com um sorriso mal ele se riu e começou a dizer que era lindo e abanei a cabeça.
- Pronto, já estás óptimo.- resmunguei, sem deixar de sorrir e assim que o senti puxar-me pela camisola olhei-o, assentindo com a cabeça ao seu pedido.- eu fico.- disse, despindo a camisola, por causa de todo aquele sangue, e subi para a sua cama, ficando muito na pontinha, para lhe dar espaço.- descansa, eu prometo que não saio daqui.- assegurei, passando as pontinhas dos dedos pela sua bochecha e estiquei-me só para lhe conseguir beijar a testa.

Quando a minha mãe deixou de tocar no tecido começou a tocar numa coisa mais macia e mais dura. Abri os olhos percebendo que ele tinha-se despido e afastei-me um bocadinho para que ele tivesse espaço encostando depois a cabeça ao seu peito. Já não tremia e isso era um bom sinal, agora só precisava de dormir e ficava óptimo. Esperava eu. - Nem se a outra vier - murmurei sorrindo quando recebi um beijinho seu na testa.

Só quando estávamos suficientemente perto um do outro é que eu reparei que Daniel tremia. Juntei as sobrancelhas, abraçando logo o seu corpo para o aquecer e puxei as mantas para cima de nós. Ri-me ao ouvir o que ele disse e abanei a cabeça, apesar de ele não ver.
- Eu não saio daqui nem que venha o papa.- brinquei, baixando desta vez os meus lábios até aos seus para lhe dar um beijinho.- dorme, eu juro que não vou a lado nenhum.- prometi, encostando-me muito a ele e fiquei a fazer-lhe festinhas nas costas.

Estava todo encolhido contra ele especialmente pela cama ser minúscula, mas assim até era bom. Suspirei contra os seus lábios não conseguindo muito bem corresponder ao seu beijo e deixei a cabeça entre o seu ombro e o seu peito agarrando-me a ele com um suspiro. - Espero que não - murmurei, se a outra viesse e o chateasse é que era pior. Fechei os olhos tentando adormecer e ao fim de alguns segundos consegui fazê-lo.

Não disse mais nada, para que conseguisse adormecer e fiquei apenas a deslizar os meus dedos pelas suas costas, sentindo a sua respiração acalmar pouco depois. Sorri, aconchegando-o bem nas mantas e contra o meu corpo e só quando fechei os olhos é que me apercebi do cansaço que sentia. Ainda os tentei abrir, para o caso de Daniel acordar de repente e precisar de alguma coisa, mas já nada me conseguiu impedir de adormecer.

Enfiei a minha cara contra uma coisa dura, que no meu sonho doeu bastante, mas como era quentinha deixei-me ficar, remexendo-me ligeiramente e fazendo barulhinhos abafados pela coisa dura e quente. Abri os olhos de repente, quando acordei do pesadelo que estava a ter e levantei a cabeça sentindo a minha cabeça rodar. Deitei-a de novo encostando-me a Brad mais uma vez e suspirei passando os dedos pela cabeça.

Uma das muitas coisas que a guerra nos modficava era o sono, eu tinha o sono muito mais leve desde que ali estava, acordava com qualquer movimento ou barulho. E foi isso que aconteceu quando senti um ligeiro movimento na cama, os meus sentidos começaram a dispertar até eu abrir os olhos. Esfreguei-os com as costas das mãos e depois de soltar um bocejo vi Daniel acordado com as mãos na cabeça.
- Estás bem? - perguntei ainda com voz de sono, encostando-o a mim.

Abri os olhos de novo quando ouvi Brad a falar a assentindo com a cabeça levantando a mesma até o olhar e voltei. -Sim, só já não consigo dormir mais - não sabia quanto tempo tinha passado, mas Karen ainda não tinha aparecido para nos matar. Suspirei de novo passando os dedos pela cara e deitei a cabeça na almofada - mas tu podes dormir mais, eu já estou melhor. - garanti

Porque é que eu nunca me deixava convencer quando ele dizia que estava bem? Se calhar era por já o conhecer tão bem, sim, devia ser por isso. Ignorei o que ele disse, ficando a vê-lo passar os dedos pela cabeça e acabei por me sentar na cama.
- Dói-te a cabeça? - perguntei, olhando-o.- eu posso ir buscar uns comprimidos à enfermaria.- murmurei.- e não vale a pena mentires porque eu vou na mesma.- avisei.

Abanei muito a cabeça impedindo-o de se mexer - não é uma dor - murmurei encostando-me a ele - ignora, já deve passar - disse, mas voltei a olha-lo - ou talvez estou só a perder a cabeça e a enlouquecer - encolhi os ombros e olhei para a tenda, felizmente a outra ainda não tinha chegado.

Estava quase a levantar-me quando Daniel me impediu de o fazer, encostando-se ao meu corpo. Revirei os olhos com um suspiro mas não consegui não passar os dedos pelo seu cabelo.
- Tens a certeza? - perguntei.- ou só estás a dizer isso para eu não me preocupar? - insisti, revirando os olhos com o que ele disse.- cala-te, eu não vou deixar que fiques maluco, tu não estás maluco.- resmunguei apesar de eu próprio ter dúvidas quanto à minha sanidade mental.

Assenti com a cabeça tentando parecer convincente apesar de não olhar. Eu não estava com dores, era pior que isso. Não respondi à sua última pergunta, mas quando ele me mandou falar levantei o olhar para ele - então porque é que eu estou a ouvir choros? - perguntei baixinhos. - e gritos.

Fiquei calado durante uns segundos, sem pensar em nada e estava a olhar para um ponto qualquer da tenda quando ouvi Daniel falar. Retomei as minhas festinhas nas suas costas até ele terminar e engoli em seco quando o fez.
- Porque estás traumatizado com o que aconteceu.- respondi, apertando-o contra mim.- as coisas a que assistimos aqui não são fáceis.- suspirei.- mas vai passar.- encostei a minha cabeça à sua.

-Estou traumatizado? - perguntei o óbvio e voltei a encostar-me a ele. Assenti com a cabeça quando disse que ia ficar bem e beijei-lhe os lábios por estar tão perto - achas que passa com beijos? - perguntei rindo-me de seguida, apesar da minha cabeça ainda estar a fazer eco.